Portal G1, https://g1.globo.com/educacao/guia-de-carreiras/noticia/2018/10/16/piloto-de-aviao-a-profissao-para-a-qual-nao-ha-crise.ghtml,
16/10/2018

Piloto de avião, a profissão para a qual não há crise

Serão necessários cerca de 620 mil novos profissionais
para pilotar aviões comerciais nos próximos 15 a
20 anos, de acordo com a
Organização da Aviação
Civil Internacional.

Por BBC

Especialistas
em aviação temem que o
crescimento da indústria leve a uma falta de pilotos para
atender à demanda por
novos voos — Foto: Getty Images

Durante
os incêndios catastróficos que
devastaram o estado americano da Califórnia em agosto deste
ano, a principal
agência responsável pelo combate às
chamas (Cal Fire) enfrentou um obstáculo
extra.

Pelo
menos 20% da sua frota de tankers –
aviões usados

como
extintores de inc
êndio
– n
ão
decolou.

E
não foi por conta de problemas técnicos.
Mas, sim, pela simples falta de profissionais para
pilotá-los.

Em
maio, a imprensa publicou que a Emirates,
uma das maiores companhias aéreas comerciais do mundo,
planejava deixar algumas
aeronaves fora de serviço temporariamente por motivos que
incluíam
“problemas na escala de pilotos”.

Ao
longo dos últimos meses, a Ryanair, uma
das maiores empresas aéreas de baixo custo da Europa,
enfrentou greves de
pilotos que levaram ao cancelamento de milhares de voos.

A
empresa atribuiu a greve a “erros de cronograma”,
mas a imprensa europeia publicou declarações de
funcionários sobre uma
“hemorragia” de pilotos para outras companhias.

Aeroportos
lotados

Serão
necessários cerca de 620 mil novos
profissionais para pilotar aviões comerciais nos
próximos 15 a 20 anos, de
acordo com a Organização da
Aviação Civil Internacional (ICAO, na sigla em
inglês), agência especializada da ONU.

As
viagens aéreas na China cresceram
exponencialmente nos últimos anos — Foto: Weliton
Martins/RPC

Em
outras palavras, estamos voando mais do
que nunca.

Segundo
dados do Banco Mundial, cerca de 311
milhões de pessoas viajaram de avião em 1970.

Passados
40 anos, em 2010, a marca de 2,6
bilhões foi ultrapassada.

Em
2017, o número de passageiros subiu para
4,1 bilhões, de acordo com a
Associação Internacional de Transporte
Aéreo
(IATA, em inglês).

A
estimativa é que até 2036 chegue a 7,8
bilhões.

“Esse
é um caso clássico de baixa oferta
e alta demanda”, explicou o ex-piloto comercial Peter Gall.

“O
desequilíbrio criou uma tempestade perfeita ,
e essa escassez vai ficar ainda pior”, escreveu o professor assistente
de
engenharia mecânica e aeroespacial da Universidade de West
Virginia, nos EUA,
em artigo publicado em julho pelo site de notícias
acadêmicas The Conversation.

Esse
crescimento na demanda por viagens
aéreas foi impulsionado principalmente pela
região da Ásia-Pacífico.

Apenas
na China, 549 milhões de pessoas
cruzaram os céus em 2017, segundo a ICAO – o dobro do
registrado cinco anos
antes.

A
última edição de um
relatório anual publicado
pela fabricante americana de aeronaves Boeing estima que a
região precisará de
260 mil pilotos extras até 2037.

Outro
problema é que a atual geração de
pilotos está ficando cada vez mais velha.

Um
estudo realizado pela CAE, fabricante de
simuladores de voo, mostrou que, em 2016, a
proporção de profissionais com mais
de 50 anos correspondia a quase metade do efetivo disponível
– a idade
obrigatória para aposentadoria de pilotos geralmente varia
entre 60 e 65 anos
em todo o mundo.

Vários
países decidiram alterar, no entanto,
o limite de idade como forma de atrasar a aposentadoria de pilotos
experientes.

O
Japão, por exemplo, aumentou para 67 anos
em 2015.

Mas a
principal tática usada pelas companhias
aéreas para lidar com a falta de mão de obra
é o tradicional “roubo”
de talentos da concorrência.

No
ano passado, a Administração Chinesa de
Aviação Civil contabilizou 1.332 pilotos
estrangeiros de 56 nacionalidades em
suas companhias aéreas – quase 10% do total de profissionais
no mundo.

Entre
outros fatores, eles foram atraídos
principalmente pelos contratos generosos, com salário anual
líquido que pode
chegar a até US$ 500 mil.

Os
países de origem dos pilotos, por sua vez,
têm dificuldade para subtituí-los

A
força “dreno” chinês pode ser
sentido principalmente em regiões com contingente mais
restrito desses
profissionais, como a África – ainda que, para algumas
companhias aéreas da
região, o interesse estrangeiro seja uma
bênção.

A
South African Airways, que vem enfrentando
uma turbulência financeira, passou a emprestar pilotos e
profissionais de
tripulação para empresas do Oriente
Médio como parte de uma estratégia para
reduzir custos e evitar corte de pessoal.

“Estamos
preocupados com a sobrevivência
da companhia aérea, e nosso principal objetivo é
proteger os funcionários da
SAA e retomar o desempenho financeiro positivo”, disse um porta-voz da
companhia em junho.

Uma
carreira em baixa?

Mas
por que é tão difícil formar pilotos?

Um
dos principais obstáculos é o custo.

Os
aspirantes têm que financiar muitas vezes
do próprio bolso todo treinamento e
aperfeiçoamento, uma conta que pode chegar
facilmente a US$ 200 mil até que os candidatos acumulem as
horas de voo
necessárias para pilotar aeronaves maiores.

Além
disso, os generosos salários oferecidos
pela China aos expatriados não são uma regra da
indústria.

Nos
EUA, especialistas dizem que o salário
inicial de um piloto pode ser de apenas US$ 15 mil por ano, abaixo da
média
salarial nacional.

“As
três principais razões para a falta
de qualificação dos pilotos são o
custo do treinamento, os tipos de requisitos
para classificação e suas respectivas taxas, os
salários e condições”, diz
Patrick Smith, piloto de aviação e especialista
em aviação, responsável pelo
site askthepilot.com.

Especialistas
avaliam que o desafio de
aumentar o interesse de potenciais candidatos na carreira de piloto
é uma
oportunidade, por exemplo, para tratar do desequilíbrio de
gênero na profissão.

A Air
Line Pilots Association International,
o maior sindicato do setor de aviação, estima que
pouco mais de 5% dos pilotos
em todo o mundo sejam mulheres – a Índia é um
caso isolado, com uma taxa de
13%, mais do que o dobro do percentual da Inglaterra (4,8%) .

“Não
há modelos inspiradores o
suficiente. Também não ajuda o fato de a
profissão ter perdido o apelo e de que
poucas companhias aéreas estejam buscando escalas e
políticas favoráveis às
famílias”, diz Tanja Harter, da European Cockpit Association
(ECA).

“Mas,
em geral, é mais uma questão
social. A opção de escolher a
profissão de piloto como carreira precisa se
tornar visível para as meninas desde cedo”, acrescenta
Harter, que tem
mais de 15 anos de experiência pilotando jatos comerciais.


também pedidos para que as companhias
aéreas aumentem os subsídios para a
formação de novos pilotos e ampliem seus
programas de treinamento.

Essa
é uma solução, no entanto, que pode
pressionar os orçamentos das companhias aéreas.

Os
negócios, de maneira geral, estão indo bem
para as companhias aéreas – os números da IATA
mostram que, em 2017, os lucros
das maiores empresas do mundo atingiram recorde de US$ 38
bilhões.

Custos
de mão de obra mais elevados, no
entanto, foram apontados como uma das razões dadas para a
organização ter
anunciado recentemente um corte de 12% na previsão de lucros
do setor em 2018.

Escassez
questionada

Mas
nem todos estão convencidos de que uma
crise de escassez se aproxima.

Em um
relatório publicado em março, a ECA
questionou as estatísticas de déficit e afirmou
que os dados das associações de
pilotos nacionais indicavam uma taxa média de desemprego de
15% entre os
pilotos na Europa.

“Não
estamos interessados

em
chamar a aten
ção
para esta demanda por pilotos. Algumas
agendas de partes interessadas parecem enfraquecer a
regulamentação de
segurança para liberar o fornecimento de pilotos para
algumas companhias
aéreas a um custo menor e/ou aumentar os lucros de algumas
organizações de
treinamento”, argumenta Tanja Harter.

A
ICAO afirma, no entanto, que há uma
necessidade de “investimento significativo em desenvolvimento de
recursos
humanos para garantir que tenhamos pilotos, controladores e outros
profissionais necessários para manter nosso setor
funcionando como o mundo
espera”.

“Cerca
de 80% dos pilotos que a frota
global precisará até 2036 não
estão voando hoje. Estamos conscientes da
importância crucial da conexão aérea
como um catalisador para o desenvolvimento
socioeconômico”.

“Em
muitas regiões do mundo, esse
crescimento potencial representa uma oportunidade de tirar uma
geração da
pobreza – literalmente e figurativamente”, explica o porta-voz da ICAO,
William Raillant-Clark.

Agora
você tem algo mais para pensar no
caminho do aeroporto.

 


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